EugenioTavares.org | Julho de 2008
Presença de Eugénio Tavares na Feira do Livro de Lisboa, Maio/Junho 2008

Conferência proferida por José António Nobre Marques Guimarães:
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A importância da emigração na formação do pensamento nativista – nacionalista cabo-verdiano:
o caso americano entre finais do século XIX e a segunda década do século XX"


Entre 1900 e 1920 saíram de Cabo Verde 27765 emigrantes em busca de condições de vida que não conseguiam alcançar na sua terra natal, frequentemente assolada por crises brutais de seca e de fome provocadas pelos tórridos ventos continentais(harmatão) e pela crónica falta de chuva, que dizimavam milhares de compatriotas e comprometiam a sobrevivência dos restantes.

Dentre os destinos então procurados os Estados Unidos da América atrairiam, de longe, o maior fluxo migratório, com 18629 indivíduos durante o período considerado, que por si só, representava 67,09% do total. [i]

Com efeito, se, na sequência da grande fome de 1863-1866, diversos núcleos de cabo-verdianos [ii] estabeleceram-se na Guiné, passando a comerciar nas suas pontas com as populações locais e com negociantes oriundos da Gâmbia e do Senegal(para onde, desde o início do século XX, viria a orientar-se uma vaga de emigração de naturais do arquipélago, frequentemente como trampolim para outros destinos), ao mesmo tempo que as autoridades coloniais portuguesas, explorando a miséria da população faminta, começaram a fazer deslocar os primeiros fluxos de mão de obra para as roças de café e de cacau em S. Tomé e Príncipe, a corrente migratória cabo-verdiana mais importante viria a ser a que, desde o último quartel do século XIX e até ao fim da segunda década do século XX, se dirigiu para os Estados Unidos da América do Norte [iii].

Mergulhando as suas raízes no recrutamento de tripulantes cabo-verdianos pelos navios baleeiros americanos que, desde o século XIX, escalavam regularmente o arquipélago, este fluxo, inicialmente muito reduzido, viria a aumentar substancialmente «após a fixação e a estabilização dos emigrantes pioneiros», processo cuja banalização seria desencadeada pelos naturais da ilha Brava [iv].

Como salientaria o jornal republicano nativista A Voz de Cabo Verde , em Abril de 1911, a propósito da emigração para a América do Norte, « Há 30 anos a emigração era encarada com repugnância nesta colónia, com excepção da ilha Brava, de onde se dirigia mais ou menos gente para a América do Norte, país que começou a ser conhecido pelos marinheiros embarcados nos navios baleeiros – em geral americanos – que ali iam recrutar tripulantes. (…) Das outras ilhas do arquipélago ninguém saía; a aversão pelo mar e por largar a sua terra natal era tradicional entre os habitantes de Cabo Verde. De 1899 em diante começou o êxodo para a América a tomar maior incremento, (…) O receio dos naturais da província de saírem das suas terras tem ido desaparecendo, vendo regressar os seus patrícios com algum capital. A fome de 1903-1904 também contribui bastante para acabar com esse receio» [v]. Tanto mais que, segundo o jornal, ao contrário dos resultados sociais calamitosos da contratação de serviçais para as roças de S. Tomé e Príncipe, sob a pressão da gestão cruelmente interessada daquela fome devastadora pelo governador Paula Cid, Cabo Verde retirava o máximo proveito da emigração para os Estados Unidos, donde os que para lá tinham ido viver e trabalhar regressavam civilizados, com outros hábitos e costumes e com dinheiro suficiente para construir ou comprar casas e terrenos que passavam a cultivar, contribuindo para o desenvolvimento da agricultura e da riqueza do país, para além das remessas que enviavam às famílias, socorrendo-as nas épocas de crise e aliviando o erário público. De facto, enquanto os seus compatriotas eram sobrexplorados em regime de autêntica escravatura nas roças de São Tomé e Príncipe(de que grande parte não regressaria ou pouco sobreviveria ao retorno, minada pela miséria, pela fome e pela doença), os emigrantes cabo-verdianos nos Estados Unidos frequentemente alcançavam um desafogo económico e um desenvolvimento cultural capazes de lhes proporcionar uma subida de estatuto social em detrimento das antigas elites do arquipélago, completamente arruinadas e hipotecados ao Banco Nacional Ultramarino que, tal como muitos dos que regressavam prósperos do Novo Mundo, acabaria por se apropriar de parte considerável do seu património [vi].

No entanto, para além da prosperidade económica potenciadora de mobilidade social que, durante muito tempo, esteve em condições de proporcionar, a emigração para os Estados Unidos contribuiria também para o desenvolvimento da identidade e da consciência política dos cabo-verdianos, uma vez que, apesar das inúmeras discriminações sociais e raciais de que eram objecto, passariam a apreender e a beneficiar das práticas democráticas há muito institucionalizadas naquele país, como a liberdade de expressão, de reunião e de associação, a par do acesso à educação, o que lhes era negado na sua terra,

Pelo que não é de admirar que combatentes pelos direitos de cidadania dos cabo-verdianos contra a dominação colonial, como Eugénio Tavares, tivessem sempre defendido esta emigração e rejeitado o envio de contratados para S. Tomé [vii], escolhendo a América do Norte para se refugiarem das perseguições que as autoridades portuguesas lhes moveram, onde viriam a ser fortemente influenciados por movimentos de emancipação social e política dos negros, sobretudo pelo pan-africanismo, corolário de um longo historial da sua luta contra a opressão social e racial [viii].

Combate que pela dimensão que tomaria – desde as revoltas, como a de Cato de Stono, em 1739, na Carolina do Sul, ou as de Nat Turner, em 1831 e de John Brown, em 1859, na Virgínia e a formação de comunidades de escravos foragidos(marrons), como a dos Danish Blacks, em 1773, que durante seis meses controlariam St. John, nas Ilhas Virgens(processo de natureza idêntica ao que viria a conduzir à independência do Haiti, primeira república negra do mundo, no princípio do século XIX), até às conquistas da luta pela igualdade de direitos e pela extinção da discriminação racial(Jim Crow Law), mesmo depois da sua abolição legal em 1964 e 1965, passando pela Guerra da Independência(1775-1783), pela Guerra Civil(1861-1865) e, depois dum longo processo de mobilização abolicionista impulsionado sobretudo por Frederick Douglas e Lloyd Garrison, pela supressão da escravatura, proclamada em 1863(e constitucionalmente regulada em 1865) por um presidente Lincoln carente, senão do reforço negro do exército nortista(que receava), pelo menos da desorganização que a libertação provocaria nas hostes sulistas – não só projectaria à escala universal o processo de emancipação dos afro-americanos e dos negros em geral, mas serviria de referência incontornável à luta de libertação de todos os povos oprimidos do mundo [ix]. Processo cujo desenvolvimento receberia um forte impulso do pan-africanismo, defendido, desde finais do século XIX, pelo advogado antilhano radicado em Inglaterra, Henry Sylvester-Williams, como manifestação de solidariedade fraterna entre africanos e povos deles descendentes e que, a partir do início do século XX, seria dirigido pelo professor universitário e escritor negro norte-americano, Dr. William Edward Burghardt Du Bois, que, ao considerar que o problema do século XX era o da barreira racial, o problema da relação das raças mais escuras com as raças mais claras na Ásia e na África, na América e nas ilhas oceânicas(que, em seu entender, estivera na origem da Guerra Civil nos Estados Unidos), advogaria a igualdade de direitos dos afro-americanos, criticando os apologistas da conciliação e capitulação perante os opressores, como Booker T. Washington, ao mesmo tempo que apoiaria a emancipação dos povos de África, opondo-se, porém, ao regresso dos negros da América ao continente africano, como defendia o apologista do sionismo negro, Marcus Garvey, lançando as bases políticas e organizativas do movimento, através da criação da Associação Nacional para o Progresso das Pessoas de Côr(National Association for the Advancement of Colered People) e dum periódico(The Crisis), e ao qual viriam mais tarde juntar-se destacados militantes oriundos do movimento operário, como os trinadinos George Padmore, antigo secretário do Comité Internacional dos Trabalhadores Negros da Internacional Sindical Vermelha e Cyril Lionel Robert James, autor dum célebre ensaio sobre a independência do Haiti e que durante alguns anos militara no movimento trotskista americano, assim como pioneiros da independência de África, como Kwame Nkrumah [x].

Ora Eugénio Tavares acabaria por aderir à Junta de Defesa dos Direitos de África em 1915, representante do pan-africanismo em Portugal(na qual viriam a filiar-se diversas organizações defensoras dos direitos dos africanos nas colónias portuguesas) até à cisão de 1919, de onde resultaria a constituição da Liga Africana, assegurando a continuidade da presença do pan-africanismo de Du Bois e o Partido Nacional Africano, defensor do sionismo negro de Marcus Garvey [xi].

Seria então em 1900, nas páginas do jornal A Alvorada, fundado no exílio americano, que Eugénio Tavares, a propósito da defesa da autonomia cabo-verdiana contra a ameaça de venda das colónias advogada por diversos sectores da burguesia portuguesa e num contexto internacional agitado pelas lutas pela independência de Cuba e das Filipinas, para além da Guerra Anglo-Boer na África do Sul, marcaria, de modo singular, o desenvolvimento do combate nativista contra a opressão colonial, defendendo não só a necessidade da criação dum partido autonomista nas colónias, mas também exortando os africanos a reapropriarem-se dos destinos de África, ao escrever: «A África portuguesa não quer que Portugal a dê de presente aos estrangeiros. Portugueses irmãos, sim; portugueses escravos, nunca.

Havemos de ter o nosso Monroe: A África para os Africanos» [xii].

Por sua vez, também Pedro Monteiro Cardoso reflectiria a forte influência do pan-africanismo na sua intervenção nativista, tendo, desde muito cedo, adoptado o pseudónimo de Afro, com o que assumiria inequivocamente a sua origem africana, contra os esforços de branqueamento associados aos fortes preconceitos raciais que dominavam a ilha do Fogo onde nascera, utilizando-o, com apenas dezasseis anos, para assinar um soneto dedicado ao Egipto, em que o exortava, em nome da sua história, a libertar-se da dominação colonial anglo-otomana e a conquistar a sua independência, postura anti-colonialista e não portuguesa que se inseria no esforço de redescoberta e recuperação da carga mítica de África operada pelos afro-americanos, no mesmo processo em que procuraram reelaborar «a própria história dos grupos africanos exilados nos Estados Unidos nas relações com o continente africano» [xiii] . Dentro desta orientação, Afro seria responsável pela polémica secção “A Manduco” n' A Voz de Cabo Verde , entre Maio de 1911 e Abril de 1919, na qual, sob a epígrafe de «Raça Negra», homenagearia a memória de diversas personalidades negras de vulto, como o cabo-verdiano André Álvares de Almada, o jornalista abolicionista brasileiro negro Luís Gama e o dirigente revolucionário haitiano Tousaint-Louverture [xiv]. Por último, tal como Eugénio Tavares, que numa deslocação aos Estados Unidos em defesa da república teria oportunidade de reflectir sobre a greve, também Pedro Monteiro Cardoso envolver-se-ia nas lutas do movimento operário, convicto de que a emancipação dos trabalhadores só poderia ser obra dos próprios trabalhadores, como decorre do poema “Unidos avante”, que dedicaria aos operários mindelenses fundadores da associação 1.º de Dezembro, entusiasmo que o realismo de Luís Loff de Vasconcelos, sobre os limites da intervenção nativista perante o reforço da política colonialista da República e a indisponibilidade para a luta revolucionária da maioria dos partidos socialistas comprometidos com o esforço de guerra(desde 1914), não deixaria de contrabalançar [xv].

Independentemente da decadência do nativismo no final da I República, ele constituiu um elo indispensável da cadeia de desenvolvimento do processo de emancipação nacional de Cabo Verde, para cuja maturação contribuiu decisivamente a emigração para os Estados Unidos, processos, até do ponto de vista cronológico, indissociáveis.

Abril de 2008

José Marques Guimarães

 

[i] Seguiam-se, por ordem decrescente, a Guiné, com 2247 emigrantes, a América do Sul (Brasil, Argentina, Uruguai e Chile), com 1968, S. Tomé e Príncipe, com 1532, Dacar(Senegal)-Gâmbia, com 1428, Portugal(Lisboa, Açores e Madeira), com 1232, Angola e Moçambique, com 366 e, finalmente, outros países, com 363(CARREIRA, António, Migrações nas ilhas de Cabo Verde , s.l., Instituto Cabo-Verdeano do Livro(Com o patrocínio das Comunidades Económicas Europeias), 1983, p. 110).

[ii] CARREIRA, op. cit., pp. 114-116.

[iii] CARREIRA, op. cit., pp. 110, 118, 122 e 125 e GUIMARÃES, José Marques, A Difusão do Nativismo em África: Cabo Verde e Angola – Séculos XIX e XX , Lisboa, África Debate, 2006, pp. 145-149. Apesar do destino migratório privilegiado ser a América do Norte,, em 1855 sairiam do arquipélago três navios para Trindade e Guadalupe, nas Antilhas, com 250 colonos contratados pelo governo francês através da Companhia Geral Marítima, o que viria a ser proibido pelas autoridades portuguesas(CARREIRA, op. cit., p. 84). Por outro lado, convém não esquecer que o fluxo migratório cabo-verdiano para os Estados Unidos diminuiria acentuadamente desde o fim da segunda década do século XX, devido às restrições legais impostas pelas autoridades americanas em 1917, 1919, 1924 e 1928, excluindo os analfabetos e reforçando os critérios de discriminação racial dos emigrantes, cuja quota anual de ingresso seria drasticamente reduzida. Entraves que seriam retomados pelo estado português a fim de garantir o envio de serviçais para as roças de café e de cacau de S. Tomé, a partir de 1864 e, também, condicionar as saídas para o estrangeiro ao prévio cumprimento das obrigações militares durante a I Guerra Mundial, após o que a ditadura salazarista aumentaria os obstáculos à emigração para a América do Norte em sintonia com o apertado regime de quotas americano. Por último, a crise económica de 1929 e a eclosão da II Guerra Mundial concluiriam o encerramento da porta de entrada da América aos emigrantes cabo-verdianos, que só limitadamente reabriria depois de 1946( GUIMARÃES, op. cit., pp. 148). .

[iv] MARGARIDO, Alfredo, «A perspectiva histórico-cultural de Pedro Monteiro Cardoso», Prefácio à reedição de Folclore Caboverdiano , de Pedro Monteiro Cardoso, Paris, Solidariedade Caboverdiana, 1983, p. LXII e CARREIRA, op. cit., pp. 82 e 120.

Sobre a suposta ancestralidade da emigração cabo-verdiana para a América do Norte, convém não perder de vista que a ausência de referências escritas concretas à sua efectivação, como reconhece António CARREIRA, retira toda a credibilidade à hipótese da sua ocorrência desde finais do século XVII ou princípios do século XVIII, tanto mais que a Guerra Civil Americana(1861-1865) e a sobrevivência legal da escravatura em Cabo Verde até ao último quartel do século XIX impediam ou, pelo menos, dificultavam extraordinariamente qualquer tipo de emigração(MEINTEL, Deirdre, «Emigração em Cabo Verde: solução ou problema?», Revista Internacional de Estudos Africanos , Lisboa, Instituto de Investigação Científica Tropical, Centro de Estudos Africanos e Asiáticos, Junho – Dezembro de 1984, n.º 2, p. 97, CARREIRA, op. cit., p. 66 e GUIMARÃES, op. cit., pp. 146-147 e 197-198) .

Por outro lado, como recorda Alfredo MARGARIDO, não existe emigração a partir de território português(ou de colónia) antes da independência do Brasil, em 1822, confundindo-se, frequentemente, colonização com emigração, quando o colono é um agente do país que o viu nascer em terras “descobertas” e colonizadas(MARGARIDO, Alfredo, «Estaremos a voltar ao fascismo?», Semanário , 30 de Março de 2007, p. 8).

[v] «A emigração», A Voz de Cabo Verde , Praia, 19 de Abril de 1911, p. 1.

[vi] Idem, ibidem; MARGARIDO, Alfredo, «O “direito” a fazer e a vender escravos», História , Lisboa, Julho de 1999, Ano XXI(nova série), nº16, pp. 28-37 e GUIMARÃES, op. cit., pp. 130 e 147-150.

[vii] TAVARES, Eugénio, «Ecos e Notícias» e «A Emigração para a América», Eugénio Tavares - Pelos Jornais (Recolha, organização e prefácio de Félix Monteiro), Praia, Instituto Caboverdiano do Livro e do Disco, 1997, Colecção “Documentos”, pp. 162-165. Em defesa da emigração cabo-verdiana para os Estados Unidos, para além da luta contra o analfabetismo que ameaçava compromete-la à luz das restrições legais americanas, escreveria Eugénio TAVARES, em 1918: «1-º Que o cabo-verdiano não vai à América apenas à cata de alimento; 2.º Que o cabo-verdiano quando regressa(pois que sempre regressa quem como ele ama a família e a terra em que nasceu), traz, não só “dollars”, senão luzes; e apresenta , não só um exterior de civilizado, mas uma noção social por vezes mais justa que aquela que de outra parte lhe seria possível trazer; 3.º Que o cabo-verdiano, na América, modifica o seu modo de ser moral, erguendo-se de um absoluto anonimato social a consciente elemento de progresso; 4.º Que, açacalado no contacto do grande povo americano, o cabo-verdiano aprende a encarar a vida por um prisma mais elevado, cria necessidades que lhe educam a vontade em lutas mais nobres, integra-se na civilização, já se não adaptando dentro da estreita exigência da cubata e da cachupa; já dificilmente suportando as exigências de um trabalho humilhante e mal remunerado, facto que já por mais de uma vez o contra-indicou para as encomendas de forças físicas periodicamente facturadas para S. Tomé e Príncipe»( TAVARES, Eugénio, «Noli me tangere(Carta a D. Alexandre de Almeida sobre a emigração cabo-verdiana para os Estados Unidos da América do Norte)», Eugénio Tavares: Viagens, Tormentas, Cartas e Postais (Recolha, organização e notas biográficas de Félix Monteiro; Prefácio de Manuela Ernestina Monteiro), s.l., Instituto de Promoção Cultural, 1999, Colecção “Documentos”, pp. 229-230).

[viii] GUIMARÃES, op. cit., pp. 153-155 e 199-205.

[ix] DU BOIS, W. E. B., As almas da gente negra , Rio de Janeiro, Lacerda Editores, 1999, pp. 100-106; GUÉRIN, Daniel, Descolonização do negro americano , Lisboa, Ulisseia, 1965, pp. 31-40 e 49-87; KINDER, Hermann e HILGEMANN, Werner, Atlas Historique , Paris, Stock, 1968, pp. 287, 371 e 555; KASPI, André, «Démocratie et ségrégation: le système américain», L'Histoire, Paris, Octobre 1997, n.º 214, p. 44 e GUIMARÃES, op. cit., pp. 54-55.

[x] DU BOIS, W. E. B., op. cit., pp.64 e 93-115; PADMORE, George, Panafricanisme ou communisme? La prochaine lutte pour l'Afrique , Paris, Présence Africaine, 1960, 97-194 e 303-387; JAMES, C. L. R., The Black Jacobins: Toussaint L' Ouverture and the San Domingo Revolution , London, Penguin Books, 2001 e BROUÉ, Pierre, Histoire de l'Internationale Communiste, 1919-1943 , Paris, Fayard, 1997, pp. 1020 e 1060.

[xi] OLIVEIRA, João Nobre de, A Imprensa Cabo-Verdiana 1820 – 1975 , Macau, Fundação de Macau, 1998, pp. 813-814; Andrade, Mário Pinto de, Origens do Nacionalismo Africano – Continuidade e ruptura nos movimentos unitários emergentes da luta contra a dominação colonial portuguesa: 1911-1961 , Lisboa, Publicações D. Quixote, 1997, pp. 172-175 e GUIMARÃES, op. cit., p. 202.

[xii] TAVARES, Eugénio, «Autonomia», A Alvorada , New Bedford, 16 de Agosto de 1900, nº 2, p. 2.

[xiii] MARGARIDO, Alfredo, «A perspectiva histórico-cultural de Pedro Monteiro Cardoso», Prefácio à reedição de Folclore Caboverdiano , de Pedro Monteiro Cardoso, Paris, Solidariedade Caboverdiana, 1983, pp. XXXII-XXXV e GUIMARÃES, op. cit., pp. 200-201.

[xiv] A Voz de Cabo Verde , Praia, 20 de Janeiro, 10 e 31 de Março de 1913, nº75, p. 3, nº 82, p. 2 e 85, p. 2.

[xv] TAVARES, Eugénio, «A greve», A Voz de Cabo Verde , Praia, 28 de Outubro de 1912, nº 63, p. 4 e MARGARIDO, Alfredo, op. cit., p. LII; Afro/Pedro Monteiro Cardoso, «Unidos, avante», A Voz de Cabo Verde , Praia, 1 de Março de 1914, nº 133, p. 3 e Vasconcelos, Luís Loff de, «Entendamo-nos»; A Voz de Cabo Verde , 18 de Fevereiro de 1918, nº 332, p. 1 e GUIMARÃES, op. cit., pp. 177-181.

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A intervenção nativista cabo-verdiana na diáspora: do exílio em Portugal à emigração para a América

Para escapar ao flagelo das secas e da fome que os dizimou aos milhares e à opressão e exploração colonial, os cabo-verdianos viram-se obrigados a procurar fora do seu arquipélago natal os meios de assegurar as condições elementares de sobrevivência.

O que, desde finais do século XIX, levá-los-ia a recorrer a Portugal, sobretudo a Lisboa, capital do império colonial português, para denunciar as formas e os instrumentos de opressão colonial através da imprensa e da literatura, escapando à censura e a outras formas de repressão directa das autoridades coloniais locais e, por outro lado, à emigração, sobretudo para os Estados Unidos, para superar as degradantes condições de vida provocadas pela opressão e pela fome que dizimava em massa fracções significativas da população das ilhas.
A progressão intelectual e material que estas expatriações viriam a proporcionar aos emigrantes e aos seus familiares que permaneciam nas ilhas contribuiria para o desenvolvimento cultural e político de sucessivas gerações de exilados, que, sobretudo, no Novo Mundo descobririam a escolarização, a democracia e a organização política e sindical da luta pela defesa dos seus direitos que lhes eram negadas na sua terra de nascimento.

Como o demonstraria a intervenção nativista de Luís Loff de Vasconcelos, de Eugénio Tavares, de José Lopes e de Pedro Monteiro Cardoso, que sistematicamente denunciariam o destino trágico dos que, em contraste com os que demandavam os Estados Unidos, se viam forçados a contratar-se como serviçais para as roças de cacau e de café de S. Tomé e Príncipe, quantas vezes coagidos pela fome e pela miséria drasticamente agravadas pelas restrições das autoridades coloniais à emigração para a América e para outros destinos potenciadores da progressão social, a que acresceria a blindagem racista da legislação norte-americana contra a imigração de analfabetos e de não brancos a partir das primeiras décadas do século XX. Obstáculos que sucessivas gerações de candidatos à emigração procurariam contornar, combatendo o analfabetismo e suprindo outras deficiências socioculturais pelos seus próprios meios, no que seriam incentivadas e orientados pela intervenção nativista dos intelectuais supra mencionados.

Maio de 2013, José Marques Guimarães

Nota curricular sobre o autor:

José António Nobre Marques Guimarães nasceu em Lisboa, em 1955, tendo obtido o grau de Doutor em História, na especialidade de História Contemporânea, em 2013, pela Universidade Aberta, onde defendeu uma tese sobre o tema: Intelectuais africanos no espaço político português: Desenvolvimento da sua intervenção nativista entre finais do século XIX e meados do século XX – o caso de Cabo Verde.
É ainda Mestre em História de África pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e Licenciado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa.